7 de dezembro de 2010

Inimigo invisível - Baseado em fatos reais


Alexa contava as horas para o sol nascer, enrolada em seus cobertores, encolhida no meio da cama de casal, a fazendo ficar menor do que era. Mesmo aos 16 anos ainda tinha medo de escuro e problemas para dormir, por que tinha medo de sonhar. Pesadelos conturbavam suas noites.
     Havia realizado o seu ‘ritual’ antes de deitar-se. Ligara a luz do banheiro, fechara todas as portas de armários, todas as gavetas e as janelas e portas do quarto. Apagara a luz, ligara o ar-condicionado e se embrulhara nas mantas. E então rezara. Coisas ruins aconteceriam se não rezasse.
     Dormiu não contendo o sono dominante. E novamente aconteceu.
     Sonhara que estava em um cemitério e andava entre os túmulos. Parou repentinamente em frente a um deles. Na lápide havia apenas um nome, sem quaisquer datas. Camila, dizia. Intrigada com a falta de informações andou em cima do túmulo e se aproximou da lápide. Mas não havia nada além do nome. Sentiu o chão estremecer e olhou para a grama que escondia abaixo de si o caixão de Camila. Levou um susto quando uma mão surgiu da terra e agarrou seu pé. Alexa se livrou do aperto da defunta e correu até encontrar um carro. Não viu quem era o motorista, apenas pediu que ele passasse por cima do cadáver de Camila. E o sonho acabou.
      Acordou assustada e chorando; eram três e meia da madrugada. Desde que abriu os olhos ficara acordada, temia dormir novamente. Foi o sonho mais real que já tivera.

Lilian acordou sufocando. Sentia seu corpo sendo empurrado para baixo na cama, tirando seu ar. Queria gritar, mas não conseguia, sua voz não saia. O intrigante era que ninguém estava sobre ela, ninguém a estava fazendo ser engolida pelo colchão. Era como uma força invisível.
     Desesperada, sem voz e quase sem ar, Lilian tentava forçar seu corpo a não ser enterrado na cama, tentando se livrar da pressão. O grito esgoelado e sem som lhe tirava todo o resto de ar dos pulmões. Ninguém estava lá. Ninguém podia ajudá-la. Lilian estava sozinha no escuro perturbador sendo esmagada por ninguém.
     E então o peso sumiu e ela tomou uma boa golada de ar, fazendo um barulho estranho no quarto antes silencioso. Seu corpo chegou a dar um pequeno salto quando a força invisível desapareceu, sem deixar quaisquer vestígios.
     Os olhos arregalados e a respiração difícil, Lilian finalmente acreditava em espíritos e demônios. Finalmente acreditava no que Alexa lhe contava.

Lilian acordou com o grito aterrorizado de sua irmã no quarto ao lado. Era um grito de desespero. Correu para acudir sua irmã. Quando chegou ao quarto viu Alexa tateando por seu pescoço em busca de arrancar algo. Ela sufocava.
     Sua mãe apareceu pouco depois e ligou a luz. Com a luz acesa Alexa fez um barulho estrangulado ao tomar fôlego. Livrando-se do aperto de seu pescoço.
     ― Alguém tentou me enforcar! ― falou com esforço.
     Olharam para todos os lados, mas não havia ninguém. Apenas Lilian tinha visto que nada visível tinha apertado o pescoço de Alexa. Só ela sabia que fora a mesma força invisível que tentara lhe afundar na cama.
     Seu pai e sua mãe achavam que alguém tinha, de alguma forma, entrado na casa e tentado matar sua filha, mas Alexa e Lilian sabiam da verdade.

Alexa fora dormir com Lilian. As duas estavam temerosas com a confirmação de seus medos. Lilian era a mais velha por um ano e meio e tentava consolar sua irmã.
     Alexa sempre disse a Lilian o que ela via. Sempre contara sobre os espíritos, mas Lilian teve que sofrer na pele para acreditar.
     Eram duas da manhã quando finalmente pegaram no sono. E os pesadelos de Alexa voltaram a toda.
     Estava em um escritório bem arrumado e elegante. Atrás da mesa de mogno havia uma figura esguia e perturbadora.
     ― Quem é você? ― perguntou Alexa.
     O homem deu um sorrisinho fantasmagórico e lhe respondeu:
      ― Manuel.
      Alexa não entendia o quê Manuel queria com ela, mas não estava a fim de descobrir. Começou a lentamente andar para trás a passos contados. Mas o homem esguio lhe apareceu mais a frente ― perto, muito perto.
     ― Não tenha medo Alexa Double. ― disse.
     ― Como sabe meu nome?
     ― Preciso de você.
     Ela ficou parada olhando fixamente os olhos profundos de Manuel, havia sinceridade.
     ― Princesa Catarina, Catarina, Catarina, Catarina, Catarina, Catarina, Catarina, Catarina, Catarina, Catarina, Catarina, Catarina, Catarina... ― começou a repetir constantemente.
     E Alexa acordou. Mas o nome ainda ressoava em sua mente, como um disco furado. Ao seu lado Lilian dormia. Chacoalhou-a para que acordasse.
     Lilian acordou na mesma hora e perguntou assustada:
     ― O que houve?
     ― Um pesadelo, muito real. ― disse apenas.
     O nome continuava conturbando sua mente.
     Catarina. Princesa Catarina.
     Alexa levantou de súbito e ligou o computador. Lilian a seguiu, confusa.
     ― O que vai fazer? São quatro horas agora. ― falou, olhando temerosa para todos os lados.
     ― Pesquisar um nome.
     Alexa abriu a ferramenta de busca e digitou: Princesa Catarina e Manuel.
     E lá estava. Princesa Catarina motou por envenenamento Manuel, seu amante.
     Arregalou os olhos de terror. Olhou para Lilian e disse:
     ― Aqui está nosso fantasma.
     Lilian perdeu o fôlego e sentou-se na cama, atordoada.
     ― O que ele quer? ― perguntou.
     ― Companhia. ― Respondeu Alexa, com uma voz mertalizada e sombria que não era dela.
     Alexa colocou a mão sobre a boca, não acreditando no que tinha acabado de falar. As duas estavam perplexas.
    E de repente Alexa levou um golpe invisível no estomago e perdeu o ar. Apavorada, Lilian socou o ar para todos os lados na ínfima esperança de acertar o agressor. Tudo em vão. Em poucos segundos as mãos invisíveis apertavam-lhe a garganta trancando a passagem de ar. Alexa, que estava caída ao chão com as mãos envoltas no estômago, levantou-se cambaleante, sem saber como ajudar sua irmã, que tateava pelo pescoço procurando ar. Mas como atingir algo que não pode se ver ou tocar?
     Em pânico Alexa gritou ― o grito mais agudo e penetrante que já se ouvira. Sua voz foi abafada por mãos invisíveis que agora soltaram-se de Lilian.
     Lilian lembrou-se da noite passada, quando quem sofria o aperto do fantasma no pescoço era Alexa, e em sua mente se passou a imagem da mãe acendendo a luz e tudo voltando ao normal. Lilian correu até o interruptor, aproveitando que o espírito estava distraído com sua irmã e ligou a luz.
     O quarto se banhou com a claridade. Alexa olhava perplexa para a irmã, não podendo crer que tivesse funcionado.
     ― Então o Miguel tem medo de luz? ― disse Alexa de boca aberta.
     E tudo se encheu com um silêncio agudo e anormal.
     Lilian foi abraçar a Alexa, com todo o carinho de irmã que tinha para oferecer.
     ― Ele vai voltar. ― concluiu Alexa, deixando o tom sombrio de sua voz planar sobre elas.
     Sim, ele iria voltar. De novo, de novo e de novo. Lilian tinha a absoluta certeza disso e sabia que um dia ele conseguiria o que quer. Apenas torcia que isso demorasse a acontecer.

2 comentários:

@ErikaFerronatto

@ErikaFerronatto